terça-feira, 13 de dezembro de 2011

Educação: O Essencial ...

        Educação. Andamos há muitos anos em reformas... e mais reformas... o real sucesso sempre em queda (um sucesso bem camuflado por estudos deturpados da realidade e pelo facilitismo, passando a ideia aos nossos alunos de que tudo se consegue sem esforço). Para muitos dos alunos que não se empenham na sua profissão ("Estudante - pessoa que estuda" in Dicionário L.P. 2008 Porto Editora), elaboram-se planos e mais planos, faz-se o pino, apela-se, por favor, ao trabalho 100 vezes durante uma aula, procuram-se estratégias e mais estratégias para motivar o aluno, avisam-se os encarregados de educação... a "festa continua". O Sistema criado, estará a ajudar os nossos alunos a crescer enquanto cidadãos responsáveis? Estaremos a preparar os nossos jovens para enfrentar a vida? Um dia no mercado de trabalho... exercendo outra profissão (que não estudante)... será que terão tantas oportunidades? ... serão equilibrados...? Terão um patrão constantemente a apelar (por favor) ao trabalho?
        Há mais de 10 anos que trabalho com alunos de percurso curricular alternativo, alunos desenquadrados do nosso sistema educativo, ditos indisciplinados e que há muito fazem parte do top desse lote de alunos que acabei de falar.  Pessoas extraordinárias que o Sistema abandonou. Numa primeira fase o Conselho de Turma dificulta-lhes a vida... estabelecem-se regras e metas para o comportamento. Exige-se. Envolve-se os pais. Desenvolvem-se projetos de acordo com as capacidades práticas e cognitivas dos alunos. Projetam-se sonhos... É um prazer para cada professor que trabalhou com estes alunos, encontrá-los hoje ... e vê-los agradecer por tudo o que a Escola lhes deu.       
        Desde os meus 19 anos que sou professor do 2º Ciclo do Ensino Básico. São mais de 20 anos a ver gradualmente os nossos alunos a encarar o Ensino como algo que não é parte estruturante dos seus projetos de vida... O ser humano é assim... quanto mais fáceis são as condições para alcançar algo, menos valor se dá ao que se consegue.
        O nosso Ministro da Educação, antes de o ser, apontava este um dos cancros do nosso Sistema Educativo... Depois de ocupar o cargo, nunca mais o ouvi, nem vi procurar a quimioterapia para destruir as células malignas deste tumor. Volta-se para as reformas.... fala-se de disciplinas essenciais (é importante ler os meus "posts" dos dias 1 e 26 de Novembro - http://serounaoserverdade.blogspot.com/2011/10/disciplinas-essenciais.html e http://serounaoserverdade.blogspot.com/2011/11/carta-aos-encarregados-de-educacao.html). Pois... por pouco me esquecia... que o Ministro se encontra refém das metas europeias que têm de ser cumpridas... O mais fácil é ... continuar a camuflar... Dar mais Matemática, mais Língua Portuguesa, mais Geografia, mais História... Dar mais do mesmo é uma forma de continuar a alimentar esse cancro (Jornal "O Público" http://www.publico.pt/Educa%C3%A7%C3%A3o/carga-horaria-de-historia-e-geografia-vai-aumentar_1524661).

"Uma Escola inclusiva, o dar a mesma oportunidade para concluir a escolaridade obrigatória a todas as crianças, foi e é um dos desígnios de uma verdadeira Democracia. Contudo, a Escola manteve-se aquela fábrica que, num processo mecanizado, molda crianças para serem um produto final comum. O perfil de um aluno à saída do Ensino Básico deverá ser o mesmo para todos, independentemente do percurso feito. O sucesso é medido por exames nacionais (iguais para todos), que avaliam apenas um saber teórico, desprezando-se completamente o saber prático, o saber fazer. Isto é uma dupla fraude, tratando-se apenas de uma massificação, resultante da Revolução Industrial. Em primeiro lugar, não se respeita o tipo de inteligência de cada indivíduo, não se respeita a sua vocação para a vida, não se respeita o que cada um sabe e tem capacidades para fazer (Gardner propõe sete tipos de inteligência, será que se respeita a(s) de cada aluno?). A segunda fraude ainda é maior, quando se arranjam artimanhas legais para fingir que todos chegam ao final da escolaridade básica com as mesmas competências, num Sistema onde grande parte dos alunos (aqueles que não têm a sorte de ter modelos familiares baseados em valores humanos) assimilam o modelo de política nacional, a filosofia de que tudo é garantido sem trabalho, mérito e esforço, a que me referi no capítulo anterior. Eis um punhado de exemplos:

- um aluno não quer ou não lhe apetece trabalhar durante o 1º Período, beneficia de um plano de recuperação. No último período escolar dá um ar da sua graça e passa. Dos 9 meses do ano lectivo, bastam dois de trabalho e já está;
- um aluno trabalhou minimamente durante o primeiro período e no início do 2º. Se não for aplicado um plano de recuperação, o professor é obrigado a passá-lo; o “sucesso” está garantido;
- um aluno apresenta dificuldades condicionantes na sua aprendizagem. Essas dificuldades resultam da sua falta de trabalho e empenho. Um relatório diz que o aluno tem necessidades educativas especiais. Aplica-se o DL 3/2008. O aluno continua sem se dedicar minimamente. O “sucesso” está-lhe quase garantido. Concorre com alunos que têm muitas dificuldades, mas que lutam para conseguirem ser alunos médios. Tem testes simplificados… etc… etc…
- um aluno apresenta graves problemas de comportamento. Criam-se turmas de percurso curricular alternativo. Dá-se-lhes a oportunidade de concluir a escolaridade básica, quando os que lutam para conseguirem ser alunos médios e têm um comportamento exemplar continuam no ensino regular. O termo “percurso curricular alternativo” é a prova de um sistema educativo com um percurso único “standerizado”….
O que me preocupa não é a oportunidade que se dá aos que não querem (estas oportunidades, supostamente foram criadas para os que, apesar de trabalharem, não conseguem). O que me preocupa são as oportunidades que não se dão aqueles que lutam, que trabalham, que se dedicam, para conseguir aquele 3. O que me preocupa são aqueles que têm dificuldades devido a um sistema que não respeita a sua inteligência e que poderiam brilhar se lhes proporcionassem condições para eles serem quem são. A estes nunca serão aplicados planos de recuperação, DL 3/2008, percurso curricular alternativo... Estes alunos nunca conseguirão brilhar, pois o sistema não deixa. Os que não querem, seguirão ao seu lado e, provavelmente, um dia terão a oportunidade de vingar, sendo comprados pelo sistema.
        Recordo uma das frases fantásticas de Howard Gardner: “Todos os indivíduos têm potencial para serem criativos, mas só serão se quiserem”. É verdade, todos têm esse potencial. Infelizmente, no nosso Sistema Educativo e no nosso país, muitos, nunca serão criativos. Uns porque não querem ou nunca quiseram, outros porque apesar de quererem, o Sistema Educativo nunca lhes proporcionou condições para isso. Será isto Escola inclusiva? Será inclusiva não diversificar as ofertas formativas, logo desde cedo, de acordo com a inteligência e capacidade que cada um demonstre? Ser-se “estudante” deixou de ser encarado como uma profissão, que exige trabalho e dedicação, sendo este um dos grandes flagelos da Educação. Enquanto este flagelo persistir, de pouco servirão: “planos de ação da matemática”; “planos tecnológicos”; estratégias e mais estratégias para conduzir os alunos, que não querem, ao sucesso! “ É fundamental que o estudante adquira uma compreensão e uma perceção nítida dos valores. Tem de aprender a ter um sentido bem definido do belo e do moralmente bom”(Albert Einstein).
O próprio termo “Escolaridade Obrigatória”, só por si não ajuda! Alguém que é obrigado a fazer algo, dificilmente o faz com motivação. Apenas aqueles alunos que trazem uma educação de casa, onde a Escola é valorizada e encarada como determinante para o seu futuro, é que ainda vão alimentando o Sistema, pois mesmo que este não os respeite no seu estilo de aprendizagem (ou inteligência), lutam e trabalham para conseguir o sucesso. Criou-se na lei, a figura dos "planos de desenvolvimento" para disfarçar. Alunos com este perfil, na Escola Pública, cada vez são mais uma raridade. O que ganham eles? Que oportunidades têm?"
               in "Base 10 - Uma Viagem pela Educação" (livro nunca publicado) Rui Rosa

2 comentários:

  1. Mais um grande post!
    Rui, guarda bem este texto, ele pode servir de base a uma boa discussão, para aqueles que querem discutir!
    Abraço!

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  2. Obrigado Mário, É sempre muito bom ter um Diretor com vontade de mudar o Sistema.

    Abraço

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