segunda-feira, 22 de dezembro de 2014

Um Natal Feliz: "A Toalha Cor de Ouro e Marfim"

        "Na quadra natalícia, homens e mulheres em todo o lado reúnem-se nas sua igrejas para renovar a admiração pelo maior milagre que o mundo já conheceu. Mas a história que mais me agrada relembrar não foi propriamente um milagre. Ricos e pobres ali tinham orado e contribuído para a perfeição daquele edifício. Mas agora aquela parte da cidade já tinha visto melhores dias. Porém, o pastor e a sua jovem mulher acreditavam na sua envelhecida igreja. Sentiam que com tinta, martelo e fé poderiam pô-la em forma. Juntos, deitaram mãos ao trabalho.
        Mas, já no final de Dezembro, uma severa tempestade fustigou o vale do rio, e o golpe mais forte atingiu a pequena igreja - um pedaço enorme de estuque ensopado pela chuva, caiu na parede interior, atrás do altar. Desalentados, o pastor e a mulher limparam a sujidade, mas não puderam esconder o buraco grosseiro. O pastor olhou para ele e obrigou-se a concluir: "Seja feita a Vossa vontade!".
        Mas a sua mulher chorava: "O Natal é já daqui a dois dias!"
        Nessa tarde, o casal, desanimado, participou num leilão feito em benefício de um grupo de jovens. O leiloeiro abriu uma caixa e desdobrou, com uma sacudidela, uma elegante toalha de mesa com renda cor de ouro e marfim. Era um objeto maravilhoso, com quase cinco metros de comprimento. Mas provinha de uma era perdida no tempo. Quem daria hoje uso a tal coisa? Houve algumas, pouco convictas, licitações. Então, o pastor foi assaltado pelo que lhe pareceu uma grande ideia. Licitou-a por seis dólares e cinquenta cêntimos.
        Levou a toalha para a igreja e pendurou-a na parede, atrás do altar. Tapava completamente o buraco. E a extraordinária beleza do seu cintilante bordado lançava um delicado brilho festivo sobre o coro. Era um grande triunfo. Feliz, voltou a dedicar-se à preparação do seu sermão de Natal.
        Pouco antes do meio dia da véspera de Natal, quando o pastor ia abrir a igreja, notou uma mulher ao frio, na paragem de autocarros.
        "O autocarro só vem daqui a uns 40 minutos!", disse ele, e convidou-a a entrar na igreja, para se aquecer.
        Ela disse-lhe que tinha vindo da cidade, nessa manhã, para uma entrevista de emprego como governanta das crianças de uma das famílias ricas locais. Mas tinha sido recusada. Refugiada de guerra, o seu inglês era imperfeito.
        A mulher sentou-se num banco, esfregou as mãos e descansou. Passado um pouco, baixou a cabeça e rezou. Olhou para cima, quando o pastor começou a compor, à frente do buraco, o grande tecido com rendas cor de ouro e marfim. Ela levantou-se de repente e subiu os degraus do coro. Olhou para a toalha de mesa. O pastor sorriu e começou a contar-lhe sobre os danos da tempestade, mas ela não pareceu ouvir. Pegou numa ponta do tecido e esfregou-a entre os dedos.
        "É minha!", disse. "É a minha toalha de banquetes"! Levantou um canto e mostrou ao surpreso pastor que havia nele um monograma bordado. "O meu marido mandou fazer a toalha especialmente para mim, em Bruxelas! Não pode haver outra igual!"
        Nos minutos seguintes, a mulher e o pastor falaram animadamente um com o outro. Ele explicou que era de Viena, que ela e o marido se tinham oposto aos nazis e que tinham decidido deixar o país. Foram aconselhados a viajar separados. O marido pô-la num comboio para a Suiça e prometeu reunir-se-lhe assim que pudesse enviar as suas coisas de casa através da fronteira.
        Nunca o voltou a ver. Mais tarde, ouviu dizer que ele tinha morrido num campo de concentração.
        "Sempre senti que era culpa minha, o partir sem ele", disse. "Talvez estes anos a vaguear sejam o meu castigo!"
        O pastor tentou reconfortá-la, pedindo-lhe que levasse consigo a toalha. Ela recusou e depois foi-se embora.
        Quando a igreja começou a encher-se na Noite de Natal, era evidente que a toalha ia ser um grande êxito. Tinha sido concebida com perícia para ter o melhor aspeto à luz das velas.
        Depois do serviço, o pastor pôs-se à porta. Muitas pessoas vieram dizer que a igreja estava maravilhosa. Um homem de rosto gentil, de meia idade - era o homem que reparava relógios na zona -, tinha um ar bastante intrigado.
        "É estranho", disse ele no seu suave sotaque. "Há muitos anos, a minha mulher, que Deus a tenha, tinha uma toalha assim. Na nossa casa, em Viena, a minha mulher punha-a na mesa", e aqui ele sorriu, "só quando o bispo vinha jantar"!
        O pastor ficou subitamente muito entusiasmado e falou-lhe sobre a mulher que horas antes tinha estado na igreja. O relojoeiro, surpreendido, agarrou o braço do pastor. "Poderá ser? Ela está viva?"
        Juntos, entraram em contacto com a família que a tinha entrevistado. Então, no carro do pastor, foram até à cidade. E quando nascia o Dia de Natal, este homem e a sua mulher - separados durante tantos Natais tristes - reencontraram-se.
        O propósito feliz da tempestade que tinha feito um buraco na parede, era agora claro para todos os que ouviram esta história. E claro que as pessoas disseram que era um milagre, mas penso que concordamos que era a época deles!"

in Selecções Reader´s Digest de Dezembro de 2014 ("Publicado originalmente nas Selecções de Dezembro de 1954)