domingo, 12 de janeiro de 2014

Avó Conceição... Viva na Minha Essência, No Meu Ser...

Avó Luzia e Avó Conceição vivas na minha essência, vivas no
meu coração, vivas no meu ser!!! Obrigado por tudo o que Sou!
      Noite de Reis... Meu Pai ligara-me, e com parcas palavras, informou que a minha querida Avó, sua Mãe, preparava-se para partir para outro Reino. Uma grande tristeza invadiu a minha alma por não poder estar com a Família naquela partida... Por outro lado, fui abrindo, em "flashes" sucessivos, todas as caixinhas da memória! Eram infindáveis... Um Império, sem limites... Um legado sem fim... Era assim que via (e vejo) a vida e obra de Maria da Conceição Oliveira!!! Com seu querido Marido (meu avô), que a deixara há 30 anos, edificaram 4 fortalezas (os seus 4 filhos), onde guardaram os mais nobres valores humanos que os meus bisavós construíram e deixaram! O Império cresceu e e hoje estende-se de um lado ao outro do Atlântico, estando no basalto da Ilha do Pico (Açores), cravadas as suas raízes! 4 filhos, 9 netos, 18 bisnetos (+ 1 em trânsito)!
      A minha dor, por não poder estar presente naquele momento, era compensada pela imortalidade da minha querida avó, pela imortalidade e vivacidade do seu legado... do seu Império!!! Meia hora depois do primeiro telefonema, meu Pai ligou-me a confirmar a partida! Teve tempo de se despedir das suas 4 fortalezas, incluindo o seu filho Fernando que se encontra nos Estados Unidos, através de um telefonema! Fechou os olhos e partiu em paz!!! Nesta noite que se avizinha, faz uma semana que a minha querida avó Conceição partiu!
        Escolheu a Noite de Reis.... escolheu a noite daquela Estrelinha que a guiou durante toda a vida! A coerência com que enfrentou a vida e a construção do seu império, guiada por valores e princípios, encontram seu testemunho em cada passo que deu! Na noite de 6 para 7 de janeiro, enquanto a Família prestava-lhe homenagem, ao seu lado esteve sempre a sua amiga de infância e vizinha, Sra. Arminda. Contemplei o seu olhar, os seus gestos, sempre com um grande sorriso nos lábios... Por algumas vezes, deslocou-se junto ao corpo e segurava-lhe a mão, parecendo comunicar-lhe pela alma. Antes da partida para o cemitério, dei um abraço à Sra. Arminda e agredeci-lhe a fidelidade daquela amizade... Ela dizia-me: "Foi uma grande amiga! Conhecíamo-nos e entendíamo-nos na perfeição. Bastava um olhar, um gesto, um assobio e logo sabia o que Ela estava a pensar!".
        Naquela noite, o vento soprava forte de noroeste com mar alteroso! É este mar tempestuoso de noroeste que traz para terra e para o baixio da localidade de "Debaixo da Rocha", objetos que andam à deriva no Mar. Na minha infância, era a altura de ir "correr o baixio" à procura de tesouros. Nesta noite de mar de noroeste, o mar traz de volta as minhas memórias. Ao olhar a Sra. Arminda, viajei trinta e muitos anos até àquela casinha junto do Cabeço do Moinho, na freguesia das Bandeiras e àquela pequena adega na localidade de "Debaixo da Rocha". A minha Avó era a melhor contadora de histórias do Mundo!!! Sentava-me junto a Ela, e viajava por um Mundo de fantasias e sonhos, parecendo muitas vezes ser personagem das histórias, tal era a emoção com que me envolvia!!! Adorava a história do "Touro Azul" (curiosamente descobri-a hoje na net em: http://obaudasmemorias.blogspot.pt/2011/01/o-touro-azul.html)! Adorava que repetisse as mesmas histórias, vezes sem fim, pois descobria sempre no recanto de cada história, pormenores que me ajudavam a fazer parte das mesmas! Aprendi a sonhar!!! Lembro-me de sonhar em navegar!!! Construir uma jangada com uma câmara de ar cheia e uma tábuas por cima, e minha avó levar-me ao "Portinho", pequena enseada junto à "Pedra do Leste" na localidade de "Debaixo da Rocha"... Sonhei marear em alto Mar... Viajei até alto mar... Tal como nos sonhos, o tempo não existia... Aqueles breves segundos que me aguentava em cima da jangada, sem as ondas a revirarem, enfrentei heroicamente grandes tempestades... Repeti nesse dia as mesmas viagens, vezes sem conta... A minha avó dizia-me para ter cuidado e parecia preocupada, mas nunca interrompeu a minha vontade de sonhar... Depois vinha a hora de almoço... Aquele cheiro e sabor a pimenta jamaica que utilizava na carne, parece presente nas minhas papilas gustativas, sempre que recordo... O seu arroz doce e o seu pão de ló... hummm!!!
        Nos últimos dez anos, a doença de Parkinson limitou-lhe paulatinamente os movimentos. A minha querida Tia Sãozinha e Sua Filha, cuidou da Sua Mãe com todo o Amor!!! Apesar de não conseguir falar e não conseguir fazer movimentos, os seus olhos falavam!!! Apresentou sempre toda a lucidez até ao fechar dos mesmos. Hoje continua viva... no coração de cada filho e de cada neto... na memória genética de cada bisneto... O Império continuar-se-á a construir!!!

Meus Avós nos Estados Unidos da América

        Deixo algumas das últimas quadras da minha querida Avó Conceição :
...
"Tive três filhos e uma filha
Que nasceram do nosso amor,
A Deus eu digo obrigado,
É como um jardim em flor.
... 
Como é ordem do mundo
Meus filhos casaram.
Nove netos que tenho,
Todos eles já cresceram.
...
Agora a minha vida,
Vivo recordando,
E os versos que eu fiz,
Baixinho os vou cantando.
...
Esta vida são dois dias,
Foi o que sempre ouvi dizer;
Viver não custa nada,
Vai tudo é saber viver.

A vida vai-se passando
E o cabelo branqueando;
A vida é coisa bela,
Lá vamos recordando.

Foi Deus que nos deu a vida
E a alma e o coração,
Dizer obrigado
É a nossa obrigação.

Eu sou agora da 3ª idade,
É como o trigo maduro.
Quem andou não tem para andar,
E a Deus pertence o futuro.
...
Debaixo de uma figueira
Sentada comi figos,
Um filho não é para um pai,
Mas um pai é para cem filhos.

Não rias, não faças troça
Quando vires um velhinho,
Se tu não morreres novo,
Passas no mesmo caminho.

Este mundo é uma vinha,
Cada qual uma latada,
Vem a morte e faz vindima
E fica a vinha vindimada
...
Com enganos escrevi,
Mas também com emoção,
Foi um pouco da vida,
De Maria da Conceição."

Maria da Conceição Oliveira, in "Os Versos Que Eu fiz, Baixinho os Vou Cantando" (versos escritos para ajudar na restauração da Igreja de N. Sra. da Boa Nova - freguesia da Bandeiras, Ilha do Pico, depois do terramoto de 9 Julho de 1998).