No
Natal passado, à semelhança de todas as épocas natalícias, o meu Pai Natal
invadiu-me o coração, despertando cada pedacinho de amor escondido no seu
interior (ver http://serounaoserverdade.blogspot.pt/2011/12/o-meu-pai-natal.html). Não é apenas no Natal, sempre que presente, o meu Pai Natal irradia
amor, paz e todos os valores mais nobres da Humanidade. A presença é eterna,
embora fisicamente não o seja. Essa presença vive nas minhas memórias e numa
memória genética que a Mãe Natureza se encarrega de preservar, geração após
geração (ver http://serounaoserverdade.blogspot.pt/2011/12/memoria-genetica-apenas-existe-morte.html).
O meu
Pai Natal é oriundo de uma família humilde. Cada pessoa que teve a sorte de
partilhar pedacinhos de mundo e de tempo com o meu Pai Natal ou qualquer um dos
seus irmãos, com toda a certeza que hoje, dentro do seu coração, existe um
tesouro constituído por muitos fragmentos de Amor, que ora podem se juntar e se
manifestar, ora estão por lá escondidos. Alguém ainda não o encontrou? Se não
conhecem o paradeiro desse tesouro, não encarem a ausência física como uma
perda.... é apenas uma transformação... dolorosa, é certo, mas a vida continua
na forma de alma alojada na nossa memória... É só isso!!! Abram a porta
da memória! Abram a porta do coração! Deixem cada um desses “pais natal”
entrar! Já dizia Lavoisier: "Na
natureza, nada se cria, nada se perde, tudo se transforma”. É apenas uma
transformação e nunca uma perda. Algo que vivia fisicamente fora de nós e um
dia passou a viver fisicamente em cada um dos nossos códigos genéticos,
manifestando-se a sua alma através de memórias.
Conheci
fisicamente quase todos os irmãos do meu Pai Natal: Tia Maria; o Tio João; o Tio José;
o Tio Francisco; a Tia Laura (a única irmã fisicamente presente). Não tive a oportunidade
de conhecer a Tia Rosa, o Tio Urbano e o Tio Manuel. Eram a família dos Urbanos.
Cada momento que tive a sorte de partilhar fisicamente com alguns dos
Urbanos, foi como que mais uma pedra preciosa que se guardou nesse tesouro que
se esconde em meu coração e que é aberto quando sou invadido pela alma de quem
lá a colocou.
Hoje
recordo um desses meus tios avós (maternos). Um Ser Humano extraordinário,
desde o primeiro momento que o vi, em cima do antigo Cais da Madalena, no seu
Ford Cortina verde, após (eu) ter feito uma travessia do Canal a bordo da “Calheta”, da "Velas" ou da "Espalamaca" (não me recordo bem qual das lanchas foi),
aquando de mais uma visita de Verão ao Pico, vindo dos Estados Unidos, no avião
que aterrou na Ilha vizinha (Ilha do Faial)… …até aquele dia que o fui visitar
ao Centro de Saúde de São Roque do Pico, já fisicamente debilitado. Desatou a
chorar mal me viu e apertou-me a mão. Fiz um esforço enorme para não chorar à
sua frente, talvez com a intenção de mostrar que tudo estava bem e de não o
fazer ficar mais triste. Tive de sair um pouco para o corredor por não conter
as glândulas lacrimais… Suspirei, entrei e abracei-o, naquela que foi a última
pedra preciosa que depositou em meu coração. Guardo-as a todas com muito
orgulho. Tantas histórias teria para contar de meu Tio Francisco! Quem não
conheceu o Francisco do Urbano, sempre presente naquela adega junto ao Poço dos
Arcos, sempre pronto para brindar com a sua angelica ou um copo do seu vinho a
todos os que passavam? Sempre com um grande sorriso e muito brincalhão. Sempre
com expressões tão características como “Uía Caim”! Adorava pregar partidinhas. Um dia, certo
senhor que muito gostava de se sentar na mesa alheia e comer e beber sem
complexos, lá se sentou à sua mesa, logo à entrada da porta da loja da adega.
Prontamente colocou, sobre a mesa, um prato com uma espécie de biscoitos
amarelos e um jarro de vinho. Biscoito após biscoito, copo após copo, lá foram
todos os biscoitos… Cada biscoito que comia, o visiante dizia: “Francisco,
estes biscoitos são algo difíceis de mastigar, mas com o vinho escorregam bem”!
O anfitrião era conhecido pelos seus belos petiscos bem condimentados. Adorava
servir bem…. Naquele dia era uma partidinha… aqueles biscoitos não eram mais do
que bocados de esferovite que vinham a proteger algo dentro de uma embalagem
qualquer!!!
Era
um Homem que adorava o Mar e a Pesca. Apanhar um sargo para um caldo era
provavelmente um dos maiores prazeres que tinha. 1981: Lembro-me de estarem a
construir a escadaria de cimento (2ª fase) de acesso à piscina natural (a nossa
Maré). Com uma cana de bambu, de cima da rocha, registei o meu nome num dos
degraus de cimento fresco. Cada um dos trabalhadores comunitários, deixou o seu
registo. Alguém escrevia: “Francisco
Urbano, Cabo Mar dos Arcos”! Era na realidade o Cabo Mar dos Arcos,
sempre presente, sempre no coração daquela pequena localidade de veraneio, à
beira do Atlântico. O meu primeiro caniço de carreto foi-me oferecido por ele.
Ainda me lembro do primeiro peixe que pesquei com ele, mesmo ali por Detrás da
Baixa. Era apenas um pequeno peixe-rei, mas foi uma emoção enorme, ver aquela
pequena bóia de cedro (feita pelo meu pai), mergulhar na água e o corpo se
encher de adrenalina ao enrolar o carreto e apanhar aquele peixe nesta minha nova
arte de pesca. Recordo-me um dia, quando descia para o pesqueiro Detrás da
Baixa, o caniço escorregar-me da mão e ser levado por uma onda. Chorei aquela
perda, sobretudo pelo valor sentimental. Mal soube, meu tio depressa me
ofereceu um novo caniço com carreto que ainda hoje guardo na adega de meus
pais.
Queria tanto contar e descrever tantas outras pedras preciosas deixadas
pelo meu querido Tio. Sei que para muitos dos leitores pouco interessam.
Poderão sempre procurar e reavivar cada pedra preciosa que alguém que vos é
querido, deixou.
Meu
querido Tio Francisco… continuas a ser e sempre serás o Cabo Mar dos Arcos, mas
sobretudo, mais um Urbano, guardião de muitos tesouros que deixaste e se escondem nos
corações daqueles como quem conviveste, sobretudo nos dos teus filhos, esposa e netos.
Adorei Rui! É uma homenagem linda!!!!
ResponderExcluirRui,Muito bunita a tua homenagem a teu tio
ResponderExcluirsempre me lembro no inverno iamos as Arcos ele tava sempre la pronto com o canudo de vidro no cordao pra tirar aguardente da barssa pra brindarmos e como dizes fica um tesouro de recordacos desses tempos..
É verdade... sempre pronto a fazer um brinde... obrigado por lembrar o canudo-prova de aguardente... Abraço.
ExcluirMuito lindo, lembro dele nos Arcos com o frasco de remédio ke usava pendurado num cordão pra tirar aguardente do barril pra brindar a gente íamos la baixo no inverno sempre velo e também no Cachorro muita vez ele tava na adega do Padre Adolfo!!
ResponderExcluirComo sempre, tudo o que escreves sai do coração e toque no do leitor. Lindo!
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